O Espiritismo
tem usado alguns textos bíblicos sobre João Batista e Elias, como prova
de que a reencarnação faz parte das doutrinas cristãs. Embora o tema já por diversas vezes tenha sido abordado, em matérias diversas, julguei conveniente tratá-lo separadamente.
Os principais textos bíblicos em torno do assunto
são os seguintes:
(a) “Eu vos enviarei o profeta Elias, antes que
venha o dia grande e terrível do Senhor” (Malaquias 4.5).
(b) “E, se quiserdes dar crédito, ele é o Elias que
havia de vir” (Mateus 11.14).
(c) “Os
discípulos O interrogavam: Por que dizem, pois, os escribas que é mister que
Elias venha primeiro? Jesus lhe
respondeu: Certamente Elias virá primeiro, e restaurará todas as coisas. Mas
digo-vos que Elias já veio, e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que
quiseram. Assim, farão eles também padecer o Filho do homem. Então entenderam
os discípulos que lhes falara a respeito de João Batista”. (Mateus 17.10-13).
(d) “Pois [João Batista] será grande diante do
Senhor...será cheio do Espírito Santo, já desde o ventre de sua mãe; e
converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus. Irá adiante dele no
espírito e poder de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos...”
(Lc 1.15-17).
Em muitos casos a Bíblia se explica a si mesma.
Quando algumas passagens se apresentam como de difícil entendimento, devemos
buscar auxílio na própria Bíblia. Em primeiro lugar, consideremos que Jesus, na
qualidade de Deus Filho, participou da inspiração da Escritura. Vejamos: (a)
“Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para
repreender, para corrigir, para instruir em justiça, a fim de que o homem de
Deus seja perfeito e perfeitamente preparado para toda boa obra” (2 Tm
3.16-17). (b) “Disse-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que, antes que
Abraão existisse, eu sou” (Jo 8.58). Aqui Jesus falou de Sua eternidade, de Sua
existência que não teve começo nem terá fim, da Sua condição de Ser não criado,
mas Criador. Sua pré-existência absoluta significa igualdade com Deus. Os
judeus compreenderam tão bem essa declaração de eternidade, que ficaram
enfurecidos e tentaram apedrejar Jesus (Jo 8.59). A mesma expressão lemos em
Êxodo 3.14,15, quando Deus fala de Sua eternidade a Moisés. Essas considerações introdutórias ao exame do
caso Elias/João Batista, por si, já criam dificuldades aos kardecistas
“cristãos” que rejeitam a divindade de Jesus.
Em razão disso, precisamos
admitir que a Bíblia não pode contradizer-se, por exemplo, dizer em Hebreus
9.27 que o homem morre apenas uma vez, e depois dizer que João Batista é a
reencarnação de Elias. O “Eu Sou”, que
existiu antes de Abraão, permeia toda a Escritura, faz parte dela, participou
da elaboração de cada doutrina, cada ensino, cada profecia.
Primeiro - Comecemos Lucas 1.15-17. Ali, de maneira
alguma se lê que João Batista seria uma reencarnação de Elias. Não se encontra nessa passagem qualquer confirmação da esdrúxula tese reencarnacionista.
Nem direta, nem indiretamente, o anjo Gabriel declara que Elias reencarnaria em
João, mas que este teria virtudes idênticas às daquele; desenvolveria um
ministério muito semelhante ao de Elias em termos de perseguição, de garra, de
ousadia, de consagração, unção e poder.
Comparemos: (a) como iniciaram seus ministérios (1 Rs 17.1 – Mt 3.1);
(b) forma ousada de repreender uma autoridade: Elias repreendeu a Acabe (1 Rs
18.17-18); João, a Herodes (Mt 14.3-4); (c) Elias foi perseguido por
Jezabel (1 Rs 19.2-3); João Batista, por
Herodias (Mt 14.6-8); os dois viviam de
forma austera e discreta.
Segundo – Quando Jesus falou “Elias já veio” (Mt
17.12) e “ele é o Elias que havia de vir” (Mt 11.14), estava em suma dizendo
que Elias não ressuscitara como todos esperavam, mas que João Batista
desempenhara o papel de precursor do Messias, com a mesma coragem, virtude e
espírito de Elias. Com estas palavras, Jesus confirmava Lucas 1.17. Situação análoga vamos encontrar em 1 Reis 2.15, assim: “O espírito de Elias
repousa sobre Eliseu”. Esta declaração
foi proferida pouco tempo depois de Elias ter sido arrebatado ao céu num
redemoinho (v.11). Pode-se interpretar de forma literal essa passagem? Não. Não se tratava de reencarnação
porque Eliseu já possuía o seu
desencarnado nele encarnado, se fosse o caso.
Os dois viveram numa mesma época. Um não podia ser encarnação do
outro; não se trata de possessão
mediúnica, ou seja, Eliseu não havia incorporado o espírito de Elias, por óbvias e irrefutáveis razões.
Terceiro -
Ainda em nossos dias usamos esse estilo de expressão: - Nunca mais
surgirá um Rui Barbosa. - O Ronaldinho é
um verdadeiro Pelé. São termos comparativos.
– Se acreditais na vinda de um Elias, “e, se quiserdes dar
crédito, ele é o Elias que havia de vir” (Mateus 11.14). Por suas mensagens
vibrantes e seu corajoso desempenho diante de situações difíceis, Elias
tornou-se símbolo dos profetas. Moisés, por exemplo, era símbolo da Lei (Lc
16.31). As profecias sobre a vinda de Elias não se contradizem. Muito pelo
contrário. Vejam: Malaquias 4.5: “Eis que eu vos envio o profeta Elias, antes
que venha o dia grande e terrível do Senhor; e converterei o coração dos pais
aos filhos e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha e fira a
terra com maldição”. Lucas 1.15-17: “Porque
será grande diante do Senhor, e não beberá vinho, nem bebida forte, e será
cheio do Espírito Santo, já desde o ventre de sua mãe. E converterá muitos dos
filhos de Israel ao Senhor, seu Deus. E
irá adiante dele no espírito e virtude de Elias, para converter o coração dos
pais aos filhos e os rebeldes, à prudência dos justos, com o fim de preparar ao
Senhor um povo bem disposto”. Logo, as profecias da vinda de Elias se cumpriram
em João Batista. Portanto, Elias veio na
pessoa de João Batista. É esta a real interpretação de Mateus 11.14 e 17.10-13.
Quarto
- O francês Hippolyte Leon Denizart Rivail soube ser ele a reencarnação dum poeta celta
chamado Allan Kardec. Ora, se a crença da reencarnação fosse assim tão
difundida e aceita; se Jesus fosse um médium, como diz o kardecismo; se
vivessem os apóstolos nesse clima de experiências espirituais, João Batista,
como aconteceu com Kardec, seria o
primeiro a saber que ele não era ele mesmo. Mas vejam: “Perguntaram-lhe [a João
Batista]: Então quem és? És tu Elias? Ele disse: Não sou. És tu o profeta? Não”.
E como insistissem para saber quem ele era, respondeu com as palavras do
profeta Isaías: “Eu sou a voz do que clama no deserto. Endireitai o caminho do
Senhor. Perguntaram-lhe: Então por que
batizas, se não és o Cristo, nem Elias, nem o profeta? João respondeu: Eu
batizo com água, mas no meio de vós está alguém que não conheceis. Este é
aquele que vem após mim, do qual eu não sou digno de desatar as correias das
sandálias” (João 1.21-27). João responde aos kardecistas: EU NÃO SOU ELIAS. João era bastante sincero e firme em suas
declarações. Se ele realmente tivesse dúvidas ou não soubesse, certamente
responderia: EU NÃO SEI SE SOU ELIAS.
Ora, um profeta que anuncia a vinda de um Salvador até então desconhecido (“alguém que
não conheceis”); que teve a humildade de sair de cena no momento em que Jesus
iniciou seu ministério (Jo 3.30); que conhecia a missão que lhe fora confiada,
a de preparar os corações para receber as Boas Novas (Is 40.3),
um profeta assim cheio do Espírito Santo (Lc 1.15) só poderia responder
com absoluta convicção. Devemos crer nas suas palavras, ou seja, ele não era
nem nunca foi Elias. Poderíamos parar por aqui, mas vamos prosseguir.
Quinto – Por ocasião da transfiguração de Jesus,
quando apareceram Moisés e Elias (Mt
17.3) João Batista já havia morrido, pois fora decapitado por ordem de Herodes
(Mt 14.10). Ora, João era quem deveria aparecer ali, e não Elias, segundo a
tese reencarnacionista. Na questão 150 do Livro dos Espíritos lê-se que a alma
“tem um fluído que lhe é próprio, colhido na atmosfera de seu planeta, e que
REPRESENTA A APARÊNCIA DE SUA ÚLTIMA REENCARNAÇÃO” (o realce é meu). Então, a última aparência daquela alma, que
em determinado momento recebeu um corpo humano e se chamou Elias, seria a de
João Batista. O que significa dizer que
os próprios “espíritos” de Kardec fazem coro com João Batista: ele não era
Elias. Eu concordo.
Sexto - A
teoria da reencarnação fundamenta-se no ciclo “morrer-renascer-morrer”, ou
seja, sucessivas mortes e sucessivos
renascimentos. No monumento sobre o túmulo de Allan Kardec, no cemitério
de Pére Lachaise, em Paris, está escrito: “Nascer, morrer, renascer ainda é
progredir sempre: esta é a lei”. Para um
espírito retornar à vida corpórea, é preciso que tenha desencarnado, isto é,
que o corpo haja descido ao pó, exceção
somente admitida no caso da primeira encarnação, no estado em que a alma é
“simples e ignorante” – tudo isso conforme a doutrina kardecista. Como Elias não morreu, mas foi trasladado ao
céu (2 Rs 2.11), não há como os
kardecistas admitirem que ele tenha reencarnado em João Batista. Seria um
contra-senso. Alegar que a história da trasladação de Elias não merece crédito,
não convence, porquanto o kardecismo usa a Bíblia na busca de apoio às suas
doutrinas. Seria outro contra-senso.
Pastor Airton Evangelista da Costa (30.11.2000)
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